Área de Proteção Ambiental (APA) das Bacias do Gama e Cabeça de Veado
Em 21 de abril de 1986, por ato do governador do Distrito Federal, foi criada a Área de Proteção Ambiental (APA) das Bacias do Gama e Cabeça de Veado (Decreto nº 9.417, de 21 de abril de 1986) sob a governança da Coordenação de Assuntos do Meio Ambiente do Distrito Federal – COAMA (Decreto 8.861, de 28 de agosto de 1985). Áreas de Proteção Ambiental são em geral extensas, com um certo grau de ocupação humana, dotadas de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e têm como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais. A APA Gama e Cabeça de Veado foi criada visando à proteção dos mananciais hídricos da bacia dos ribeirões Gama e Cabeça de Veado, da biodiversidade do cerrado e das pesquisas ecológicas ali conduzidas pela Universidade de Brasília (UnB), pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pelo Jardim Botânico de Brasília, além de outras instituições.
O Decreto de criação já estabeleceu o Macrozoneamento Ambiental da Unidade, no âmbito do qual a Reserva Ecológica do IBGE integra a Zona de Vida Silvestre, que inclui todas as unidades de conservação e as áreas de preservação permanentes (80 metros ao redor das margens dos córregos e ribeirões que drenam a APA) e perfaz 10.000 ha de áreas protegidas contínuas. A APA Gama-Cabeça de Veado totaliza uma área de 23.650 hectares e é a unidade de conservação de uso sustentável do Distrito Federal que possui em seu território, além de áreas urbanas e rurais, o maior número de unidades de conservação de proteção integral e de uso sustentável.
Reserva da Biosfera do Cerrado: compromisso internacional
Reservas da Biosfera são áreas internacionalmente reconhecidas por sua importância para a conservação da biodiversidade e para a promoção do desenvolvimento sustentável. As Reservas da Biosfera são propostas pelos governos nacionais e devem satisfazer uma série de critérios e de condições para serem reconhecidas oficialmente e integrarem a Rede Mundial de Reservas da Biosfera (Salgado, 2004). Ao longo do tempo, a UNESCO tem desenvolvido diversas estratégias para o Programa: Marco Estatutário (1995); Estratégia de Sevilha (1995); Plano de Ação de Madri (2008-2013); Estratégia de Lima (2015-2025); e Plano de Ação de Lima (2016-2025). Essas estratégias devem ser consideradas e devem guiar todas as Reservas da Biosfera dentro da Rede Mundial de Reservas da Biosfera (Veríssimo, 2013).
O Brasil aderiu ao Programa Homem e Biosfera da UNESCO em 1974, criando a Comissão Brasileira do Programa Homem e Biosfera – COBRAMAB (Decreto Federal 74.685, de 14 de outubro de 1974), sob a coordenação do Ministério das Relações Exteriores. Em 21 de setembro de 1999, novo Decreto Federal redefiniu a composição, estrutura e coordenação da COBRAMAB, que passou a vincular-se ao Ministério do Meio Ambiente. Desde então, os gestores da Reserva Ecológica do IBGE representam oficialmente o Ministério do Planejamento na referida comissão (membro titular e suplente).
O país conta hoje com sete Reservas da Biosfera nos vários biomas nacionais (Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga, Pantanal, Amazônia, Serra do Espinhaço), todas de grandes dimensões, articuladas pela Rede Brasileira de Reservas da Biosfera e reconhecidas pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC, instituido pela Lei n° 9.985, de 18 de julho de 2000 e regulamentada pelo Decreto nº 4.340, de 22 de agosto de 2002. No capítulo VI, art. 41 do SNUC, considera-se Reserva da Biosfera “um modelo, adotado internacionalmente, de gestão integrada, participativa e sustentável dos recursos naturais, com objetivos básicos de preservação da diversidade biológica, desenvolvimento de atividades de pesquisa, monitoramento ambiental, educação ambiental, desenvolvimento sustentável e melhoria da qualidade de vida das populações”. O dispositivo legal define o zoneamento das Reservas da Biosfera baseado em três categorias (Zonas Núcleo, Zonas de Amortecimento e Zonas de Transição), definidas pelo Programa MAB/UNESCO (O Homem e a Biosfera), e determina que devem ser geridas por um Conselho Deliberativo, paritário, e reconhecidas pelo Programa MAB/UNESCO, do qual o Brasil é signatário (Salgado, 2004).
Reconhecendo a imensa importância da sociobiodiversidade do Cerrado, o Bureau do Conselho Internacional de Coordenação do Programa “O Homem e a Biosfera” – MaB, aprovou, em Paris, em 08 de outubro de 1993, a criação da Reserva da Biosfera do Cerrado – RBC. Esse foi o primeiro reconhecimento internacional da importância do Cerrado, a savana de maior biodiversidade do Planeta e que originalmente cobria 25% do território nacional. Sob o aspecto jurídico e legal, a RBC – Fase 1 foi definida em seus limites, funções e sistemas de gestão pela Lei Distrital no 742 de 28 de julho de 1994. Em 2016, por meio do Decreto nº 37.615 de 09/09/2016, foi criado o Comitê Distrital da Reserva da Biosfera do Cerrado e estabelecidas suas atribuições legais (Comitê Distrital da Reserva da Biosfera do Cerrado, 2017). Em 2018, uma solicitação formal de expansão dos limites, com inclusão de novas áreas-núcleo e definição das zonas de amortecimento na Reserva da Biosfera do Cerrado foi encaminhada pelo Comitê Distrital da Reserva da Biosfera do Cerrado à COBRAMAB, para avaliação e providências de reconhecimento junto à UNESCO.
A Reserva Ecológica do IBGE possui o reconhecimento internacional da UNESCO como parte da Zona Núcleo da Reserva da Biosfera do Cerrado, e a participação de seus gestores se mantem efetiva desde o antigo Conselho da RBC ao atual Comitê Distrital. A Zona Núcleo de uma Reserva da Biosfera é formada por áreas dedicadas à proteção a longo prazo de paisagens, ecossistemas, espécies e variedade genética. Nela deve haver monitoramento dos ecossistemas minimamente perturbados, e é onde se realizam pesquisas não-destrutivas e outros usos de baixo impacto (educação). A Reserva da Biosfera do Cerrado – RBC tem como zona-núcleo cerca de 45% da APA Gama Cabeça-de-Veado (Estação Ecológica do Jardim Botânico; Reserva Ecológica do IBGE e Fazenda Água Limpa da UnB), o Parque Nacional de Brasília e a Estação Ecológica de Águas Emendadas (UNESCO, 2003). A conservação da biodiversidade e a produção científica são hoje os maiores produtos das Zonas Núcleo da RBC-DF.
Contudo, prioridades e ações efetivas são necessárias para a conservação e o desenvolvimento sustentável do território abrangido pela RBC-DF, integrando esforços e apoios mútuos para solução das várias lacunas e problemas levantados nas duas avaliações decenais de rotina (Salgado, 2004; Veríssimo, 2017). Especialmente em sua Zona de Amortecimento (zonas circundantes ou contíguas à zona-núcleo, onde apenas atividades compatíveis com os objetivos de conservação podem ter lugar), submetida a pressões crescentes de urbanização, configura-se um cenário com efeitos negativos sobre o meio ambiente, a economia e o bem-estar social, com riscos crescentes para as próprias Unidades de Conservação que compõem as Zonas-Núcleo.
A Reserva da Biosfera do Cerrado tem grande potencial para amenizar esses conflitos e ajudar a encontrar soluções que organizem as ações territoriais rumo ao Objetivos de Desenvolvimento Sustentável assumidos pelos Governos Federal, Estaduais, Municipais e Distrital (Agenda 2030). Conhecidas como “laboratórios-vivos” de informações e experiências locais para desafios globais, e sob a orientação do Plano de Lima (2016-2025), as RBs deverão concentrar ações de cooperação compatíveis com práticas ecológicas saudáveis, que possam reforçar a investigação científica, monitoramento das condições ambientais, sociais, econômicas e culturais, treinamento e educação em suas Zonas de Amortecimento. Deverão também contribuir para manter a integridade e os importantes serviços ecossistêmicos advindos de suas Zonas-Núcleo. Desafios para o Plano de Ações a ser configurado pelo Comitê Distrital. Compromisso especial para o IBGE, instituição responsável por monitorar os avanços nacionais rumo à sustentabilidade.
Referências Bibliográficas
- SALGADO, Gustavo S M e GALINKIN, Maurício. Reserva da Biosfera do 25 Cerrado, um Patrimônio de Brasília – Avaliação dos Dez Anos de Criação da Reserva da Biosfera do Cerrado – DF, Fundação Centro Brasileiro de Referência e Apoio Cultural – Cebrac – Unesco. Brasília, 2004.
- UNESCO. Subsídios ao zoneamento da APA Gama – Cabeça de Veado e Reserva da Biosfera do Cerrado: caracterização e conflitos socioambientais. Brasília, DF: Unesco Brasil, 2003.
- VERÍSSIMO DOS SANTOS, M. Produto 3 – Análise e avaliação da representatividade ecológica do sistema de áreas protegidas do Distrito Federal. UNESCO. Brasília, p. 130. 2013.
- VERÍSSIMO, M. Produto 5. Relatório Analítico (consultoria). Projeto Consolidação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC- LifeWEb. MMA/GIZ. Brasília, 2017.