A partir do mês de maio, começa a estiagem em Brasília e o clima seco serve como aviso: é chegada a hora de iniciar os aceiros na região. Manual, com máquina ou com uso controlado de fogo, a prática é uma das principais formas de prevenir incêndios florestais e é realizada todos os anos na Reserva Ecológica do IBGE e em seus arredores. A queimada controlada (aceiro negro) foi efetuada nos dias 12, 13 e 14 deste mês.
A operação foi comandada pelo gerente de preservação do Jardim Botânico, Diego Miranda, e contou com a participação de servidores e brigadistas do IBRAM, FAL/UnB, Reserva Ecológica do IBGE, CIAB/Marinha, ALA1/Aeronáutica, Prevfogo/IBAMA, DER, CBMDF, todos parceiros do grupo do Plano de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais no Distrito Federal – PPCIF/DF, coordenado pela SEMA. Foram realizados 30 quilômetros de aceiro negro, do portão dois do Jardim Botânico até a Marinha, finalizando no Parque Ecológico do Tororó.
Além da participação de servidores como o brigadista voluntário Bento da Silva Barros, que atua desde 1986 na atividade, o IBGE também contou com o trabalho de seis brigadistas florestais contratados para monitorar a área da Reserva Ecológica no período de seca, entre julho e dezembro. Bento explica que os aceiros com máquina, realizados em toda área de divisa da Reserva, começaram em junho. O aceiro negro foi realizado posteriormente.
Além de todos os cuidados necessários para realização das queimadas controladas, o Instituto também oferece um caminhão-pipa para dar mais segurança à operação. “Na execução dos aceiros negros, o IBGE disponibiliza um caminhão-pipa com tanque d’água de 5 mil litros. O caminhão-pipa é uma ferramenta do IBGE que está disponível o ano inteiro. Além de servir para combate a incêndios florestais, a gente utiliza diariamente, conforme a necessidade”, conta.
Cerrado tem proteção natural contra o fogo, mas é preciso preservar
O desenvolvimento do bioma Cerrado caminhou junto com a ocorrência do fogo na região. Isso é visível nas características da vegetação que predomina na área: árvores com cascas grossas para proteger contra o fogo e grandes reservas de nutrientes nas raízes para favorecer a rebrota nos casos em que as chamas são muito intensas. Mesmo as plantas rasteiras também mostram estratégias como produção de sementes resistentes ao fogo ou estruturas subterrâneas protegidas prontas para rebrota depois dos incêndios.
Diante dessa coexistência do Cerrado com o fogo, por que então prevenir os incêndios na região? “Essa necessidade surge com as mudanças que os humanos trouxeram nessa relação. Incêndios naturais provavelmente ocorriam com baixa frequência, iniciados por raios que vinham com as primeiras chuvas do fim da seca. Atualmente, os incêndios de áreas de cerrado desprotegidas são muito mais frequentes e são causados por atividades criminosas ou pelo descontrole do fogo usado para queima de lixo ou “limpeza” de terrenos vizinhos de áreas naturais. Tais incêndios muitas vezes saem do controle quando ocorrem no meio da estiagem. Nesses cenários, até mesmo porções de vegetação que naturalmente não queimariam, como as matas de galeria, podem ser atingidas pelas chamas e sofrerem impactos aos quais não tem estratégias naturais de defesa”, explica o analista de biodiversidade do Centro de Estudos Ambientais do Cerrado do IBGE (GEC) Frederico Takahashi.
Ainda segundo o servidor, Unidades de Conservação como a Reserva Ecológica do IBGE precisam de cuidado redobrado contra incêndios acidentais ou criminosos. Isso porque na área são conduzidos diversos estudos científicos avaliando múltiplos aspectos da ecologia do Cerrado, alguns realizados continuamente por décadas. Dessa forma, um incêndio pode não só trazer um impacto para a biodiversidade da área, que demoraria anos para se recuperar, mas também impediria a conclusão de diversos estudos que visam entender melhor as características e o funcionamento do Cerrado. Apesar do fogo poder ser usado no manejo de área protegidas, de modo a simular os incêndios naturais, esses precisam ser conduzidos de forma controlada e baseada em estudos para definir onde e quando deve ser utilizado. E para o emprego do fogo como ferramenta de conservação, é vital uma equipe de brigadistas capacitada para conduzir as queimadas de forma a atingir somente as áreas pré-definidas.